quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

estudioalbuquerque: Cerâmicas - Projeto Prato Feito - 2006

estudioalbuquerque: Cerâmicas - Projeto Prato Feito - 2006: "Projeto Prato Feito - sob orientação de Erli Fantini - Ouro Preto - 2006 Acervo do artista"

CARTA À VIZINHA DO ANDAR DE CIMA


                                                 Foto retirada de: kitespaper.blogspot.com

Cara vizinha,

Há mais de 15 anos moro no apartamento abaixo do seu.
Nesse período, ouvi (não tenho ângulo para vê-la) a moça do prédio ao lado, defronte a sua janela enviuvar e os filhos dela se tornarem adolescentes.
Aguentei as brigas domésticas do apartamento que divide o muro comigo, vi o filho cantar e tocar violão com aquela voz de taquara rachada até se tornar homem, aguentei o papagaio gritando GALO todos os dias.
A antiga dona do seu apartamento, tinha uma boutique em casa e meu interfone não parava de tocar. Quando ela estava animada, treinava dança do ventre com sininhos nos tornozelos nesse quarto que hoje, você dorme. Quando ela se mudou, alugou o apartamento para uma república de pré universitários que fumavam maconha na janela e engraçado, o cheiro, vinha até mim. Eles assistiam os jogos de futebol em uma enorme TV (pay-per-view) e a turma toda ficava no mesmo quarto, ou seja, acima da minha cabeça.
Escutei os primeiros choros da Vitória (aquela bebê de olhos azuis) e antes disso, as festas que haviam no apartamento quando a mãe ainda era solteira.
Como já havíamos conversado antes, não jogo bituca de cigarro pelos corredores do condomínio e nem ao menos, porto um cigarro aceso na área de circulação.
Jogo o meu lixo fora nos horários e dias certos e não encho o saco de ninguém berrando para me abrirem a portaria, pois esqueci minhas chaves.
Mas escuto suas gritarias com sua irmã (?), seus sapatos de salto e suas reuniões noturnas, que diga-se de passagem, são muito mais frequentes que as minhas.
Então, voltando a falar sobre o cigarro, acho extremamente altruísta e louvável que seu genitor saia de casa e vá fumar no portão, em consideração a sua alergia, mas ele é seu pai.
Levando em conta a história de comunidade e seu blábláblá, devo dizer que se não faço muito para melhorar a minha, também não a atrapalho.
Entendo também que, comunidade é o conjunto de pessoas que habitam meu entorno e da minha soleira para dentro é o meu lar.
Não vou atender seu pedido para ficar com as janelas fechadas em qualquer época. Não quero e vamos combinar, é ridículo. Estou na minha casa e fecho as minhas janelas quando necessário aos meus interesses.
Não sou a única fumante nas imediações e mesmo se parasse, não seria a última pessoa a poluir o meio ambiente.
Então para finalizar a missiva, vá encher o saco de outro.

P.S. Você só descobriu que a Amy Winehouse existia agora que ela veio ao Brasil? Se liga minha filha! Desliga o som e vai ler!    


quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

ACONTECE NAS MELHORES FAMÍLIAS

Criação e Fotografia: Marina Oliveira.



Vinha andando com aquela preguiça de segunda-feira e na portaria vizinha ao meu trabalho parecia um caos. Todos os funcionários da empresa na calçada, com seus crachás dependurados, uns nos celulares, outros aos cochichos e um carro patrulha da PM com as luzes ligadas em cima da calçada.
Passei por eles curiosa e fui direto ao Café do Átrio tomar meu expresso e lá fico sabendo que certo casal, que costumo encontrar almoçando todos os dias, havia sido o motivo da tal confusão.
O rapaz esfaqueou a namorada e se jogou do terceiro andar. Duas ambulâncias do SAMU vieram em socorro. Me disseram que ele não se machucou como o esperado para quem se atira de um prédio. Entrou na ambulância conversando com paramédicos, polícia e colegas. Ela, vai ficar bem.
Não sei a razão para tal violência (nem quero saber) mas sei que ingenuamente nunca penso que aconteça
algo assim tão próximo a mim. Está nos jornais todos os dias, mas nada é dito na reunião de condomínio.
Se minha vizinha apanha? 
Realmente não sei.
Tento manter a ilusão de que essas coisas acontecem longe.
Longe? Aonde??????  

Em todos os lugares.

Nada de novo aconteceu.
Minha pergunta é  - como nos acostumamos com a violência do cotidiano de uma maneira tão trivial?

Ainda é quarta-feira e tirando as famílias envolvidas, a notícia já é velha.

Almoço no mesmo café, mas além do livro habitual, agora carrego um pouco de perplexidade e faço o meu pedido ao garçom com um gosto amargo na boca.

ÓCULOS DE SOL

Os óculos de sol são o insulfilm dos olhos.

VERDADE

A verdade é uma variável quantitativa contínua - varia para quem diz e para quem escuta.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

PROCURA-SE

 

Procura-se a doida que existia dentro de mim.
Era uma Cassinha de cabelo comprido, cacheado, pintado de vermelho.
Aquela desbocada, furiosa, passional e que gostava de conversar sacanagens.
Gostava de rua, café, música, livrarias, homens de terno, comida, sexo animal e selvagem, crianças, cerveja, conversa fiada, papo filosófico e histórico, vaidosa.

Uma outra tomou o lugar dela.
Estóica, quieta, com os palavrões na cabeça e não mais na boca.
Desapaixonada, indiferente, simpática e distante.
Toma café por hábito e não por prazer. Não frequenta mais as livrarias.
Não passeia pela Savassi, cortou os cabelos, não tem mais cachos.
Conversa muito com estranhos, mas não diz nada.

Qualquer informação da Cassinha antiga, favor avisar aqui no blog pois tenho muitas saudades dela.